sexta-feira, 1 de maio de 2015

TERCEIRIZAÇÃO: A QUEM INTERESSA?

Este breve ensaio sobre o projeto de lei 4330/2004 de autoria do deputado Sandro Mabel, que regulamenta a terceirização no País, a priori deixa de lado (mas não esquecidas) as questões políticas que motivaram ao presidente da Câmara Federal deputado Eduardo Cunha do PMDB a colocá-lo em pauta 11 anos depois do mesmo ter sido apresentado naquela casa legislativa. Antes porém é de bom alvitre tecer alguns comentários sobre as complicações e prejuízos que está lei (caso venha a entrar em vigência) causará aos trabalhadores brasileiros, e em especial a administração pública. Assim, para melhor compreensão, cabe-nos definir o que seria terceirização. Para esse fim recorre-se a definição clássica do dicionário virtual de sinônimos e traduções de palavras para quem terceirização no campo administrativo e econômico
“... é a forma de organização estrutural que permite a uma empresa transferir a outra suas atividades-meio, proporcionando maior disponibilidade de recursos para sua atividade-fim, reduzindo a estrutura operacional, diminuindo os custos, economizando recursos e desburocratizando a administração...”

Desse modo, conforme depreende-se da leitura conceitual acima, tem-se a noção da amplitude dos efeitos maléficos deste mecanismo para os trabalhadores, uma vez que a mencionada redução estrutural e diminuição de custos ali mencionadas certamente acontecerá apenas por meio do corte de pessoal e salários, o que na prática significa que através da terceirização, uma multinacional por exemplo que tenha alto padrão remuneratório em seu quadro de pessoal, poderá subcontratar trabalhadores de uma empresa com padrão salarial bem inferior do que seria se fossem contratados diretamente. Além disto a multinacional do exemplo acima mencionado ficará isenta dos encargos sociais e trabalhistas já que estes serão de responsabilidade da empresa contratada, que em função dos baixos salários pagos aos seus trabalhadores, recolherá menos encargos. Tal situação certamente tornará possível que contratante e contratada otimizarem seus custos e consequentemente ampliem sua margem de lucros, enquanto os trabalhadores passarão do emprego ao subemprego ficando desta forma com seus direitos limitados a nova realidade que se lhes apresentam.

Outra agravante do projeto 4330/2004 diz respeito aos tipos de atividades que poderão ser contratados de forma precária, posto que atualmente o TST - Tribunal Superior do Trabalho, embora entendendo ser a contratação indireta ilegal, por meio da súmula 331 regulamenta-a e permite-a apenas para as atividades meios, ou seja, aquelas atividades que não são a principal da empresa contratante, já a vigência do projeto em comento haverá a ampliação a esta forma precária de contratação de mão de obras para as atividades fins, assim designadas como aquelas que são a principal atividade da empresa contratante, podendo inclusive estender-se para a administração pública como se denota da leitura de seu artigo 12.
Art. 12. Nos contratos de prestação de serviços a terceiros em que a contratante for a Administração Pública, a responsabilidade pelos encargos trabalhistas é regulada pelo art. 71 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. 

Neste aspecto torna-se cristalina a ofensa ao comando constitucional emanado do art. 37, inciso II que tem sido o pilar base da moralidade e probidade para o serviço público, posto que preconiza acerca dos certames públicos.
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

Percebam que serão graves e irreparáveis os prejuízos para a administração pública que mesmo sob a égide do comando constitucional retro mencionado, padece com toda sorte de apadrinhamentos, oriundos das nomeações para cargos de provimento em comissão e contratações temporárias, que vastamente usadas como moeda de troca, para barganhar apoio político aos gestores em todas as esferas de governos e Poderes Republicanos, seja no executivo, no legislativo ou no judiciário. E para aumentar ainda mais este leque os políticos de todo País poderão contar com mais esta opção que facilitara de forma significativa as indicações de pessoas incompetentes e descompromissadas com o serviço público apenas porque é amigo ou parente de alguém importante.

Diante disto a sociedade na atualmente possui a convicção de que os serviços públicos não funcionam e que servidores públicos não trabalham, imaginem caros leitores com a leva de possibilidades que este malfadado projeto de lei oferece através destas terceirizações, por meio de empresas que em muitos casos pertencem a parasitas que as colocam em nomes de “laranjas” apenas para representar seus interesses escusos e estão entranhados no cerne do poder público apenas para garantir seus quinhões as custas do suor do povo brasileiro. Com efeito, aquilo que para o setor privado é sinônimo de lucro, para o serviço público certamente se reverterá em prejuízos não apenas financeiros, em relação aos tributos pagos pelos contribuintes, pois tal ferramenta servirá para aumentar ainda mais as formas de desvio de verbas e atender aos interesses políticos e econômicos de gestores públicos e empresários inescrupulosos, refletindo principalmente na má qualidade do atendimento e dos serviços prestados prejudicando de forma inequívoca toda a sociedade brasileira.

Quanto aos trabalhadores deste setor os prejuízos também serão incomensuráveis uma vez diante da possibilidade de terceirizar-se todas as atividades no setor público, o inciso II do artigo 37 da Constituição Federal de 1988 se tornará letra morta, já que os gestores poderão optar pela forma mais lucrativa seja política ou financeiramente falando, qual seja usar a terceirização para indicações de seus correligionários nas mais variadas funções na administração pública, e deste modo, aqueles que forem contratados/indicados pela via precária terão enormes e intransponíveis barreiras em relação aos seus direitos.

Apenas para uma vaga noção do que ora afirma-se, analisemos a leitura do projeto de lei 4330 ao disciplinar em seu artigo 9º que a contratante “...PODE estender ao trabalhador da empresa de prestação de serviços a terceiros benefícios oferecidos aos seus empregados, tais como atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados, existentes nas dependências da contratante ou local por ela designado...”. Percebam que trata-se de uma redação aparentemente benéfica aos trabalhadores, não fosse uma simples palavra, PODE, da qual somos conhecedores não se trata de uma imposição mais uma opção que o contratante pode ou não fazê-lo, é sabido também, que mesmo os comandos normativos que DETERMINAM, pouco ou nada são observados por contratantes e contratados em geral, assim ao usar o verbo pode o legislador afirma explicitamente que o contratante o cumprirá se assim o desejar. Então se ele (contratante) tivesse que estender os benefícios de seu quadro de pessoal aos terceirizados, certamente optaria por contratar diretamente pessoal qualificado de acordo com o padrão de sua empresa e no caso da administração pública a opção lógica seria o certame público.

Em que pese ao não cumprimento das obrigações trabalhistas para com os trabalhadores e os encargos sociais, em relação a iniciativa privada, a lei determina que a empresa contratante responderá subsidiariamente com a contratada, ou seja, caso a contratada não pague suas dívidas oriundas daquele contrato, a empresa que contratou ficará obrigada a fazê-lo. Já em relação ao setor público, tudo leva ao entendimento de que se isto vier a ocorrer o trabalhador ficará no prejuízo, uma vez que o artigo 12 do projeto em analise determina que nos contratos com a administração pública a responsabilidade pelos encargos trabalhistas reger-se-á pelo art. 71 da lei nº 8.666 de 21 de junho de 1993, senão vejamos:
Art. 12. Nos contratos de prestação de serviços a terceiros em que a contratante for a Administração Pública, a responsabilidade pelos encargos trabalhistas é regulada pelo art. 71 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.

Percebam que nos contratos em que for contratante a administração pública a responsabilidade pelos encargos trabalhistas serão regidos pelas disposições do artigo 71 da Lei 8.666 de julho de 1993, que regula o art. 37, inciso XXI da Constituição Federal, e trata das licitações e contratos da Administração Pública. Este comando normativo em seus parágrafos 1º e 2º, impõem que “...não serão transferidas à administração pública a responsabilidade pelo inadimplemento dos contratos em relação aos encargos trabalhistas, fiscais ou comerciais, tão pouco poderá este inadimplemento onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis...” ficando está com a responsabilidade solidária, apenas em relação aos encargos previdenciários.
Art. 71 O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.
§ 1º A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.
§ 2º A Administração Pública responde solidariamente com o contratado pelos encargos previdenciários resultantes da execução do contrato, nos termos do art. 31 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

Diante dos fatos narrado acima, é fácil perceber que este projeto de lei trata-se a priori de caráter extremamente prejudicial a classe trabalhadora brasileira e caso seja concretizado, estaremos fadados a voltar ao período do coronelismo brasileiro, e mais, está lei além de desrespeitar frontalmente preceitos constitucionais, fere mortalmente a Consolidação das Leis do Trabalho que consolidou toda legislação trabalhistas brasileiras e é tida até hoje como uma das maiores conquistas dos trabalhadores brasileiros, servindo de embasamento para diversos comandos normativos infraconstitucionais em vigência em nosso ordenamento jurídico. Estaremos assim, 72 anos depois desta conquista que obtida durante o governo de Getúlio Vargas em 1943, retroagindo a condições de trabalho piores do enfrentamos nos períodos mais conturbados da história política brasileira.


Concluo o presente ensaio convicto de que o senhor presidente da Câmara Federal Eduardo Cunha, colocou em pauta este projeto com dois objetivos principais, em primeiro lugar foi defender os interesses dos empresários que financiaram e financiam sua campanha e de seus correligionários políticos e em segundo para medir forças com o Palácio do Planalto, isto porque caso a presidente Dilma Rousseff venha a veta-lo, terá contra si além de vários parlamentares das duas casas legislativas (Câmara e Senado Federal), todo seguimento empresarial brasileiros, por sua vez se sanciona-lo estará contrariando as bandeiras de seu partido e os interesses dos trabalhadores brasileiros, que levaram o PT ao governo 14 anos atrás, e mais, dando, subsídios para que os próprios parlamentares que aprovaram a lei ora analisada saiam as ruas com o discurso de que o governo que se diz representar os trabalhadores aprovou uma lei que contraria todos este princípios.

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